SE A VIDA TE DER UM LIMÃO
- Rosana Almeida
- 8 de ago. de 2020
- 3 min de leitura
Atualizado: 11 de set. de 2020
O que você faz quando a vida te dá um limão? Espreme até...
Em primeiro lugar desejo ressaltar que não me refiro ao Jogo do Contente da personagem Pollyana. Na minha infância e adolescência li Pollyana e Pollyana Moça e foi bom. Quando já no colégio, uma querida amiga, a Ana Maria de Souza “com z”, (onde andará ela?) comentou que Pollyana era uma idiota. Ana se referia, eu creio, à impossibilidade da personagem de sentir e manifestar insatisfação. Penso também que na época do comentário estávamos na década de 70, anos da mão de chumbo da ditadura e da censura, e Ana, sempre muito atenta, se referia ao uso da personagem como uma manipulação de mentes em desenvolvimento.
O referido Jogo do Contente trata-se realmente de uma negação maníaca das frustrações usada de maneira indiscriminada pela personagem. Esta ficava assim impedida de contatar com a força que as insatisfações podem produzir.
E é desta força, produto das insatisfações, aliada a um potencial criativo que produzirão a limonada da segunda parte da frase que escolhi para título desta crônica. É fato, a gente precisa ter muita criatividade para fazer limonada com os limões que a vida nos dá.
Nas minhas andanças mentais em que o dito popular me perseguia e não gerava limonada, digo crônica, resolvi destrinchar o dito e avaliá-lo pelo não-dito manifestamente, ou seja, o dito intrinsecamente. Não foi à toa que escolhi para a chamada deste texto só a primeira parte da frase – é a mais rica de significados. Vamos lá.
Se a vida te der... refere-se a acontecimentos que independem da nossa vontade. Estes acontecimentos são os que mais desafiam a nossa tolerância e a nossa criatividade. Um dia um querido professor nos apresentou a situação geradora de frustração de uma forma básica para ajudar o pensar: quando a realidade frustra, bem poucas vezes podemos modificá-la, aliás, na maioria das vezes não podemos. Resta-nos então a tolerância (atenção aqui, tolerância nunca foi acomodação. Este é um mau uso da palavra.) que implica numa modificação interna. E esta modificação interna é o princípio da atitude criativa.
É interessante como muitas vezes definimos como um “estar azeda” ou “azedo” exatamente o período de avaliação íntima de uma situação em que só nos restará tolerar. Neste momento estamos identificando, embora intuitivamente ainda, um dos limões que teremos que espremer.
A frase continua com um limão. Este objeto direto pode apontar para caminhos antagônicos. Há pessoas que irão se fartar de comiserar-se com esta ideia. E olha, o quê não faltam são pessoas que precisam sentir pena delas mesmas. Se esse for o caso poderemos fazer bem pouco ou nada por elas. Mas se por outro lado um limão representar um desafio, aí sim a largada estará dada.
Os limões oferecidos pela vida são de uma variedade imensa e serão fatores complicadores maiores ou menores, de acordo com as características inatas de cada um e nestas eu incluo uma maior tendência à acomodação. Variam também de acordo com as expectativas que alimentamos no decorrer da vida. É claro que precisamos sonhar, termos ideais de vida, mas isso não significa que uma dose de realismo em nossos sonhos nos fará mal. O sonhar que nos leva adiante é muito mais que um mero devaneio. É um crer que mudanças aconteçam de forma natural e espontânea como fruto de um movimento intuitivo num primeiro momento e “elaborativo” posteriormente.
Aliás, se eu fosse dada a receitas de bolo, a fórmulas de auto-ajuda, eu diria que para se fazer uma gostosa limonada com um limão dado pela vida você deve num primeiro momento tolerar deveras a frustração, saber que as mais importantes soluções não são imediatas, ao contrário, necessitam de um longo tempo para serem construídas e para isso precisam ser sonhadas. O tempo da tolerância verdadeira é um tempo de sonho. Você pensou que seria fácil?
E uma última ideia que penso estar implícita na primeira parte do dito: se a vida te der um limão. Implica que para você gerar qualquer modificação na realidade externa e/ ou interna o problema tem que ser seu. Os limões que a vida dá ao outro não cabem a nós processá-los. Parece egoísmo, mas não é. Resta-nos muitas vezes vê-los apodrecer na fruteira da vida alheia.
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