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Histórias de Tina



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Aliás foi ela quem escreveu esse parágrafo inicial. Tinha enchido meia página de sinais circunflexos. Resolvi deixar a sua marca para inaugurar a série.

Entre tantos momentos que passamos juntas, escolhi o que segue para contar em primeiro lugar.

Não sei precisar quando ocorreu. Tina está comigo desde meados de 2017, o dia exato em que quebrei a perna e ela passou sua primeira noite sozinha em sua nova casa. Mas essa ocasião merece uma crônica ou um conto só para ela.

Deve ter acontecido em 2018 porque eu já estava andando e demorei um pouco mais de seis meses para me recuperar. Estava na cozinha, perdida em minhas tristezas. Daqueles dias que a depressão se hospeda e não avisa até quando vai ficar. E se se demora muito começa a dar vontade de morrer.

Nem sempre quando dá vontade de morrer é impulso de se matar. Não! Porque suicídio são duas coisas: vontade de morrer e de se matar. Deve ter gente que cometeu suicídio só pelo ímpeto de acabar com uma dor e matou quem estava sofrendo a dor, ou seja, ele mesmo. Isso nunca saberemos porque quem comete suicídio morre e não fica vivo para ajudar nas pesquisas. Talvez esse seja um dos assuntos para conhecermos no além.

Por enquanto fica assim: um suicídio só será bem-sucedido, não me entendam mal... Quem se mata realmente tinha os dois desejos: o de matar e o de morrer.

Voltando àquela manhã que de fatídica não teve nada, muito pelo contrário, marcou o elo que nos une: Tina e eu.

Tina estava na sala, entretida com algum brinquedo seu. Ela é a minha primeira gata. Fui ‘carrocheira’ a vida toda. Não sabia quanto os gatos são sensíveis. Talvez por isso levam fama de companhia de bruxa. Eu, como disse, perdida em minhas tristezas quando se formou a seguinte frase em minha mente... É... seria melhor qu’eu morresse mesmo...

Nesse exato momento escuto uma voz aguda: E eu?

Ela estava aos meus pés. Nem tinha me dado conta da sua presença. Ao contrário do que se supõe não se afastou de mim por causa dos meus sentimentos ruins, daquela ansiedade que repele ao invés de atrair.

Tina veio se salvar e me salvou. Sentei-me em uma cadeira coringa que havia em minha cozinha e a peguei no colo. A abracei e pensei. Encaminhei os pensamentos pelo mesmo canal que os outros haviam entrado. Por toques sensíveis, beijos em sua testa de gato, aquela região entre as orelhas. Beijei, beijei e me obriguei a inspirar boas energias. Toda mãe sabe como fazer isso.

Eu jurei: Tina, nunca mais pensarei em morrer. Enquanto vivermos ficaremos juntas.

No mais íntimo do meu ser oro para que eu viva enquanto ela viver. Não tolero a ideia de me ausentar por algum motivo e não ter o controle do seu amparo.

Mas isso não gosto nem de pensar quando ela está por perto.

Será que ela já percebeu?


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