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Perto dos Sentimentos (Parte Final)

Você leu a Parte I de Perto dos sentimentos? Se não leia e faça o exercício proposto. Depois volte para exte texto e termine a experiência. Vai ser bom.


Vamos falar de neurose? (Parte final)


Essa casa lhe parece familiar. Tem algo nela que insiste que você pense, tente se lembrar. E você se recorda. Essa casa é sua! E você nem se lembra mais de qual compromisso precisava comparecer. Nada é mais importante do que voltar. É isso o que você quer fazer. Se volta e caminha decidido (a). No caminho arranca uma das flores do canteiro e em um passo alegre agarra a maçaneta da porta...


Antes que você entre eu preciso te falar uma coisa. Eu quero e preciso que você não se esqueça: você não sentiu medo, nem terror, nem nojo de nada! Tudo que há lá dentro é seu e nada é mau. Essa casa é mais do que sua, ela é você! E quer e merece ser reconhecida. Em cada objeto existe algo grudado – um sentimento – que também precisa ser reconhecido. Como sendo seu. Agora avante!


Eu estou do seu lado....

Você abre a porta, primeiro devagar, sentindo o cheiro da luz que sai por ela. Decidido (a) abre mais e mais. Olha para o chão e toca com as pontas dos sapatos nos tacos que estão descolados. Parece até saber de cor quantos e quais são e o som que cada um faz. Você entra e deixa a porta aberta. O sofá é enorme. Toma toda a sala e as almofadas estão bagunçadas. A que você mais gosta está esgarçada. É tão lindo o bordado dela! Quem bordou mesmo? Foi sua mãe? Aquela bola com as hastes espetadas que te cheira a saudade é um novelo de lã com duas agulhas de tricô enfiadas nele. Sua avó deixou ali e você não consegue lembrar por que ela não voltou para pegar. Consegue sim! É que você não quer pensar nisso agora. Tem muita coisa para reconhecer.


Aquele móvel com a porta quase estourando, que nem fecha direito, você precisa abrir para ver tudo que tem ali. Muito papel colorido, estojos com lápis e canetas. Caixas de lápis de cor, algumas novas, outras bem velhas com tocos de lápis que dava até para jogar fora, mas você guardava. Dá para perceber que o vermelho e o preto foram muito usados. O lápis azul também foi muito usado porque muito apontado, mas a sua ponta encontra-se mais íntegra. Tem revistas recortadas, tanto figuras quanto palavras. Tem cadernos com folhas brancas, outros com linhas. Tem uma boneca de pano toda torta por causa da força que você fez para guardar ela lá dentro.


Você olha para cima e vê a aranha do lustre, dessas aranhas de pernas longas e transparentes, muito ocupada em tecer sua teia. Dessa vez você consegue vê-la de qualquer ângulo da sala.

Você parece ouvir vozes e instintivamente volta-se na direção da porta da cozinha. Pareciam risadas. A cozinha sempre foi um lugar alegre. Você tem boas recordações. Vai até lá e fica surpreso (a) porque está vazia. Você esperava encontrar alguém ali. Vai direto até uma gaveta. Essa gaveta despertava muito o seu interesse. Sua mãe vivia enfiando a mão dentro dela e pegando algo. Cada vez que ela enfiava a mão e tirava vinha algo diferente. Você ficava fascinado (a). Mas sua mãe não deixava você brincar com o que havia ali dentro. Às vezes, só para fazer você parar de chorar te dava uma pequena colher e aí você chorava mais porque não era aquilo que você queria... você vai então e abre a gaveta e pega aquele objeto fascinante que a mãe nunca deixava você pôr a mão. Tinha um cabo de madeira, mas não era a colher de pau não! Ah, era uma faca! Você pega a faca e fica admirando o reflexo da lâmina. Admirado (a) quase põe o dedo no gume da faca, mas não faz isso. Guarda novamente e fica olhando umas louças que tem dentro da pia. Alguém saiu correndo e não lavou o próprio prato, o copo nem as talheres. Quem será? Você sai da cozinha porque está decidido (a) a ir no andar de cima.


Dessa vez você entra no quarto que está mais perto da escada em primeiro lugar. É um quarto de ... adolescente. Sim! Há livros e quadros. Aviões! Esse quarto era fascinante, mas você também não podia entrar nele. Seu irmão dizia que você quebraria os aviões dele. Você não ia quebrar. Só brincar. Mas porque aqueles livros saiam do alinhamento naquele canto da estante. Seu irmão pensava que ninguém percebia, mas você sim. Tinha alguma coisa escondida lá. Você põe a mão atrás dos livros e pega o objeto escondido. Um porta retrato. Com a foto de uma moça bonita. Muito bonita. Ela era amiga do seu irmão? Você não lembra direito, mas tem tanta coisa para ver e descobrir. Você sai do quarto largando o porta retrato que quase cai.


Quando você sai do quarto parece não ter dúvida do que vai fazer agora. Entra no banheiro e fecha a porta atrás de si. Procura algo. Tem certeza de que está ali. Olha bem... e acha! Meio escondida, no chão, a revista dobrada. Além dos aviões, seu irmão também não te deixava ver aquelas revistas que ele guardava no quarto dele. Você folheia e nada te chama à atenção, mas uma página foi rasgada. Rasgada às pressas porque mal rasgada, mas não dá para ver nada nos pedaços que ficaram presos na parte costurada. Você larga a revista e vai ao outro quarto. O quarto do bebê. O seu quarto....


Você não lembrava se o véu do mosqueteiro era amarelo ou branco. Você olha e reconhece.... A poltrona, ao lado do berço, onde sua mãe ficava até você dormir e os livros de onde ela lia as histórias fascinantes. Você tinha uma preferida. Qual era mesmo? Sua mãe não se importava de conta-la muitas vezes. Na mesma mesa onde sua mãe apoiava os livros também apoiava sua mamadeira. Você lembra dela dizendo que no dia seguinte ela traria o seu leite num copo. Que você já estava grande para tomar mamadeira e você ficava sempre na dúvida se seria assim mesmo porque no dia seguinte ela entrava no quarto com a mamadeira. Você ficava um pouco confuso (a). Você não lembra do dia que a sua mãe cumpriu a promessa, mas lembra sim de como foi bom tomar o leite no copo igual o seu irmão fazia e vocês passaram a fazer todas as refeições juntos, na cozinha. Isso você lembra. Satisfeito (a) sai do quarto e dirige-se ao da porta enorme.


Coloca uma mão em cada maçaneta e faz força para empurrar as duas portas ao mesmo tempo...


Eu não irei terminar esse jogo para você. Deixarei que este último quarto fique inteiro para a sua imaginação. Pode ser imaginação ou podem ser lembranças ou as duas coisas misturadas. Busque dentro de você. Volte nos outros cômodos e acrescente algo que faltou. Se houve algo que você não gostou pode descartar, mas não sem antes pensar no porquê.

Você pode sempre se voltar para dentro de você. Pode e deve, com frequência, olhar para os seus sentimentos com curiosidade, sem julgamento. Esqueça os critérios de certo ou errado, bonito ou feio, bom ou ruim. Tente não julgar e ser curioso.


Carpe diem!!


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